Mário Lago: o Samba precisa respeitar a gramática
“Oh, senhores letrados, deixem o samba divorciado da gramática, deixem o samba na boca da gente do morro, não mudem o samba do morro do Estácio para o Catete [bairro de classe média, zona sul do Rio de janeiro]”.
Por Chico Socorro
Essa frase faz parte da crônica “O samba e a gramática”, de autoria do jornalista Francisco Guimarães, publicada nos anos 30, na qual ele defende a linguagem popular, mesmo que fira a sintaxe gramatical.
Mário Lago faz parte de uma geração de compositores populares que tinham estudado, ao lado de Noel Rosa, Fernando Lobo, Custódio Mesquita, Ary Barroso, entre outros. Alguns deles tinham até freqüentado a Universidade.
Mário se recordava vivamente das lições de seu professor de português, Antenor Nascentes do Colégio Pedro II. E o uso do português correto, sem erros gramaticais, era um dos motivos de suas desavenças com os parceiros musicais.
Vale a pena ilustrar uma dessas discussões sobre o português, relatando um caso ocorrido com a marcha “O que é que me acontecia”, composta em parceria com Benedito Lacerda em 1939 e interpretada pelo cantor Almirante, cuja letra é reproduzida a seguir:
Se numa noite sem lua
sozinha na rua
fazendo não sei quê
eu lhe encontrasse e chamasse,
agarrasse, abraçasse
e beijasse você,
responda sem mentira e hipocrisia:
o que é que você fazia?
A música já estava pronta, liberada pela censura e Mario levanta questão:
“—Benedito, isto aqui está errado. O certo é ”eu a encontrasse”…
Mas o parceiro não aceitou a explicação e para encerrar o assunto argumentou:
“—- Parceiro, que história é essa? Você já viu professor de gramática num bloco de sujo, cantando música de carnaval?
Não houve jeito, Mário acabou concordando e a letra ficou como estava.
Finalizamos o artigo de hoje com a letra de Não tem Tradução, de Noel Rosa que focaliza também a questão do uso correto do português no samba:
“A gíria que o morro criou
bem cedo a cidade adotou e usou
tudo aquilo que o malandro pronuncia
com voz macia é brasileiro
já passou do português “.
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Publicitário, nasceu em São Paulo e veio para Santa Catarina no final da década de 1970 para implantar e gerenciar o setor de comunicação e marketing da Cia Hering de Blumenau. Chico Socorro é consultor independente de comunicação e marketing para as áreas de licitações públicas e prospecção de novos negócios.
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