Muito além do ”Arrombaste, Laíla”, uma história que divertiu gerações
Nascida em 1926, Laíla Freyesleben brilhou na sociedade florianopolitana entre as décadas de 1940 e 1960.

Capa do livro: a trajetória de um símbolo da cidade – Divulagação
Bonita, elegante sem ser afetada, circulava com desenvoltura em todas as rodas, inclusive culturais: apoiou e atuou no Grupo Sul, o movimento modernista catarinense que tinha Salim Miguel e Eglê Malheiros entre suas maiores expressões. Em 1994 foi homenageada como Cidadã Masc (Museu de Arte de Santa Catarina), quando o museu completou 45 anos de fundação.
Nos anos 1940 assinou uma coluna de variedades intitulada “Cantinho Feminino” no jornal A Gazeta. Mas, longe de ser uma coluna de futilidades, foi uma janela que abriu para discutir questões femininas, como o exercício do direito de votar, instituído no Brasil em 1932, e a participação ativa da mulher na sociedade. Por meio de seus escritos em A Gazeta também defendeu a arte moderna e a perspectiva de Florianópolis tornar-se uma cidade turística, algo que só se concretizou ao longo das décadas de 1960 e 1970.

Obra de Juarez Machado, de 1997: o cenário do episódio “Arrombaste, Laíla” recriado pelo artista – Divulgação
A reação do garçom
Sempre presente às rodas da cidade, Laíla certa vez foi ao Bar e Restaurante Pérola, acompanhada por amigos. O garçom Ferri se aproximou para anotar seu pedido. E ela:
– Veja-me algo cítrico para beber
Ferri deu um passo para trás e exclamou:
– Arrombaste, Laíla!
A frase ficou consagrada pelo seu tom manezês:
– Arrombassi, Laíla!
E este tom acabou emprestado ao título do livro, publicado mais de 70 anos depois do ocorrido no bar Pérola, com textos da monografia de Margari Maria Comparsi, apresentada ao curso de História da Udesc. “Arrombassi, Laíla: Conheça a biografia de um dos personagens mais simbólicos da Florianópolis do século XX e descubra nela a história da própria cidade”. A edição da obra ficou a cargo de André Freyesleben Ferreira, filho de Laíla.
Lançado em maio deste ano, o livro teve baixa tiragem e vem sendo distribuído para amigos e admiradores da personagem, além de bibliotecas públicas e escolares. André reconhece que a obra não é definitiva, porque o material sobre sua mãe é muito vasto e sempre aparecem imagens e documentos novos. É possível que futuramente seja lançada uma segunda edição, ampliada.
Sacudindo conceitos
Em 1951, Laíla foi eleita Miss Florianópolis. No ano seguinte, participou com destaque do Miss Elegante Bangu, tradicional desfile realizado pela fábrica de tecidos Bangu, no Rio de Janeiro.

Miss e modelo consagrada em Florianópolis e no Rio de Janeiro – Divulgção
Poliglota, cantava músicas em francês e inglês e, em 1952 e 1953, esmerou-se na pronúncia do latim para interpretar Verônica na Procissão do Senhor Jesus dos Passos daqueles anos.

Interpretando o ‘Canto de Verônica’, na Procissão do Senhor dos Passos em 1952 – Divulgação
“A curiosidade e a impetuosidade instigaram-na a agir, a ‘sacudir’, como ela mesma diz”, assinala Margari em sua monografia. “Pôde fazer muitas coisas que eram vetadas à maioria das mulheres de sua época, sem transgressões mais contundentes. Foi jornalista, foi miss, fez teatro, cantou, dançou em festas beneficentes (…) Para muitos dos habitantes, identificados com aqueles que protagonizaram a elite urbana, foi a artista da cidade, a musa, a feminista”. Além de atuar no jornal A Gazeta, foi também funcionária pública. Deixou o emprego depois de casar-se com o engenheiro Cláudio Valente Ferreira, em 1955, com quem teve três filhos.
A expressão “Arrombaste, Laíla!” tornou-se referência humorística da cidade, até por uma característica ancestral do ilhéu, de ser gozador por natureza. A palavra “arrombaste” tem o significado estrito de surpresa, de algo que transcende expectativas, tipo “você se superou”. Laíla carregou docemente esse estigma – de certa maneira injusto, por causa de sua biografia tão rica. Ela morreu em 2010, aos 84 anos.
Clique aqui e confira material já publicado no caros sobre Laíla Freyesleben.
Da Coluna de Carlos Damião (ND, 23/06/2018)
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