Olhos
Abrem-se quando nascemos e se fecham quando morremos: os olhos.
Para alguém privado da capacidade de ver, cerra-se essa abertura crucial para o mundo de cores e formas. Desliga-se a luz que nos invade na claridade das manhãs, na ofuscante iluminação de um meio-dia ao sol, no lusco-fusco do fim do dia e início da noite, que nasce com a sina de nos mergulhar nas trevas.
Porém, além de ver, os olhos se oferecem para ser vistos.
O olhar ilumina o rosto, como dizem muitos poetas e mestres da literatura.
Olhares raivosos fulminam como raios potentes e devastadores.
Olhos brilhantes de crianças que riem expressam toda a beleza, a meiguice e a ternura do mundo.
Olhares furtivos nos incomodam e confundem: é como se olhassem de forma fugidia e traidora. Tornou-se famoso o olhar de Capitu, personagem de Dom Casmurro, romance de Machado de Assis. Segundo o grande mestre, ela tinha “olhos de uma cigana oblíqua e dissimulada”.
Olhos que olham nos olhos do interlocutor são veículos de uma sinceridade que raramente é falsa. É como se a verdade exigisse uma mirada direta e sustentada para apenas então revelar-se, voluntária ou involuntariamente.
Olhos podem olhar e não ver. Assim como alguém que troca a imagem que tem diante de si por outra, a imagem que tem dentro de si; ou que mergulha na distração ao invés de na contemplação ou na pura atenção.
A cor dos olhos é pura magia e alimento para a poesia: olhos negros, castanhos, verdes, azuis – cada um se transforma em motivo de canto poético, transformando-se em beleza, orgulho, devassidão, meiguice, ciúme e o que mais aprouver aos poetas.
É dos olhos que surge o maior indicativo da tristeza, da dor, do sofrimento: a lágrima. Poucos resistem à comoção provocada pelo choro. Lágrimas cristalinas que, depois de se juntarem sobre o espelho da retina, formando os “olhos rasos d`água”, descem pela face, são capazes até de derreter corações os mais empedernidos.
Mas os olhos, igualmente, podem mostrar, numa explosão, aparentemente contraditória, as maiores demonstrações de alegria. Por isso, consagrou-se a expressão “chorar de rir”.
Olhos e olhares nos acompanham ao longo da vida. Eles tanto nos revelam quanto podem nos ajudar nas fugas emocionais, nos enfrentamentos. A coragem e a covardia; o furor e a calma; a saudade e a compaixão, tudo isso está representado no olhar.
Olhos são o espelho da alma, diz a frase tão repetida. Basta prestar atenção nos olhos e no jeito de olhar das pessoas para se ver o quanto de verdade há nessas palavras.
Olhos, olhos, maravilhas com que a maioria dos seres vivos foi presenteada. É preciso ter consciência de sua importância nesta nossa complexa e sublime máquina chamada “corpo”. É preciso usá-los não somente para olhar, mas sobretudo para ver, aproveitando toda a espetacular potencialidade desse sentido.
É necessário também termos consciência do tipo de olhar que lançamos sobre o mundo e as pessoas. Olhemos direito, honrando o maravilhoso dom do olhar.
Professor aposentado de Filosofia da UERJ. Escritor, dedica-se a crônicas e contos. Publicou “Olhando a cidade e outros olhares”. Desde a infância, foi embalado pelas ondas do rádio. Foi locutor de rádio, atividade que ainda exercita narrando seus próprios escritos e outros textos. Empenha-se no momento em implantar a Web “Rádio Sorriso” em Niterói, RJ, cidade onde mora.
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